quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Gato, o chamariz de garotas

A minha humilde habitação vai receber um novo membro: um gato. É verdade, eu e os meus colegas decidimos (após uma sessão de lutas de almofadas e puxões de cabelos repletos de insultos) arranjar um animal de estimação. O rapaz ao lado do meu quarto foi quem mais ripostou, dizia ele que os restos da comida eram seus e não ia partilhar com um saco de pulgas. Contudo, demovi-o com uma grade de minis e um pires de tremoços.

O que é fantástico. Moro num duplex, ou "palace" como lhe chamam as pessoas (ok, só eu e um dos meus compinchas). E vou ter um gato, um felino, fofo, meigo, brincalhão, um chamariz de raparigas. Assim que a notícia se espalhar, a minha casa vai ter mais afluência feminina que os saldos da Zara. Vão cair que nem tordos. Até já me estou a imaginar deitado no sofá, com o felino no colo, e meia dúzia de loiras esculturais à minha volta. Ansiosas por fazer uma festinha ao ser mais fofo das redondezas.



E pensei em jogos para fazer com ele. Para além de o ensinar a tocar piano, porque um gato em si já é um chamariz de raparigas, um gato a tocar piano traz a Jessica Alba lá dos States só para lhe fazer uma festinha e ampará-lo no seu peito, bem aconchegado e a ronronar... Portanto, vou comprar uma tamiça, ou uma corda, vá, e ato no gato, depois atiro-o pela varanda e seguro na outra ponta - bungee jumping felino! Vai ser um espectáculo ver o gato a voar seis andares e depois voltar para cima com um ar descontraído e sedutor, tipo iô-iô. As miúdas devem adorar gatos radicais!

Só falta descobrir um nome para o bichinho!

Ai Belzebu, bora ser diferentes!

Eu não sou esquisito. Mas, por vezes, sou picuinhas ou comichoso. Gosto disto, não gosto daquilo, tolero algumas coisas, odeio muitas coisas. Tenho algumas preferências clubísticas, alguns gostos musicais, alguns gostos fílmicos e literários. Gosto de cenas que pouca gente gosta e odeio alguns sucessos de bilheteira. Bem, no fundo, todos somos um pouco assim.

E é curioso. Não sou psicólogo nem nada que se pareça. Observação escusada, até. Porém, seria idiota dizê-lo sem um sentido. Não percebo muito de pessoas, mas não há pessoas iguais. É impossível traçar um perfil igual a outro. Sou moreno, oiço José Cid e gosto dos filmes do Tarantino. Mas nem todos os ouvintes de Cid gostam de Tarantino, ou vice-versa.

Afinal, o que é cultura? Cultura literária, cultura fílmica, cultura musical... cultura. Quem decide o que é cultura? Serei anti-cultura portuguesa se não gostar de Saramago? E há muito que digo que se enganaram no prémio. Um serralheiro mecânico ganhou um prémio nobel da literatura, enfim. Até o Ministério da Cultura fecharam e abriram um gabinetezito num vão de uma escada para tratar do cultivo dessa coisa. Autores, músicos, realizadores, actores. Que classe é essa? Será Morangos com Açúcar, um sucesso de bilheteira, o melhor filme português de todos os tempos? Será Tony Carreira o porta-estandarte da música portuguesa? Será tudo o que é português mau? Concordo com tudo e ainda discordo muito mais. As nossas diferenças fazem com que não sejamos todos iguais.

E por isso não troco um concerto de José Cid por um concerto dos Pearl Jam nem tão pouco um livro sobre futebol por um best-seller do Dan Brown. Ainda bem que posso escolher. Agora está na moda ver reality shows vazios de cultura, e todas as semanas batem recordes de audiências. Eu vejo, às vezes, e não tenho vergonha de o dizer. Riu-me daquelas palhaçadas, aprecio as jeitosas que se passeiam em trajes menores, faço piadas com eles e uso frases no meu dia-a-dia. Se calhar, como disse em tempos um professor que tive, "vejo... para descultivar o cérebro". Também deve fazer falta. Até a terra, quando não descansa, deixa de ser produtiva. É isso mesmo que vou fazer. Vou ligar a tv e descultivar um pouco o cérebro.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O final do Verão



Lá andava o rapaz a correr e a pular atrás do avô. Às vezes ajudava, com as mãos pequenas e um minúsculo sacho. Fazia festas na terra mas para ele era como se estivesse a cavar metade da horta com cada cavadela. Outras vezes, na sua maioria, claro está, só incomodava. Tropeçava no próprio chão e, volta e meia, lá ia o joelho contra uma pedra e as pobres calças, já remendadas, teriam de passar novamente pelas mãos habilidosas da avó.

O final do Verão era marcado, todos os anos, pela mesma imagem. Vendo bem, é das melhores e mais presentes recordações que lhe restam.

Acordava, com o Sol já forte, apesar de pouco passarem das oito da manhã. Espreitava pela janela do seu quarto e lá ia o burro, com um velhote às costas e umas cestas. Nas cestas ia o trabalho do ano, ou pelo menos uma parte, em direcção à vila onde esperava arrecadar umas moedas e trocar o resto por sementes. O produto da horta alimentava a casa mas só estas visitas à vila podiam pagar o gasóleo do tractor ou os medicamentos para as dores do corpo, pobre coluna sempre a queixar-se e um andar coxo ao qual se tinha habituado ainda em boa idade, eram o suficiente para acompanhar o pão com doce pela manhã. Uma chávena de café, uma fatia do pão amassado pela esposa, um bocado de doce de tomate ou de compota, consoante a sorte, e dois comprimidos que um médico, na altura português, lhe receitou para poder trabalhar mais uns anos. Passava-se a semana e todos os dias a mesa era posta para um a mais. À hora da ceia todos olhavam para o canto da mesa, ainda órfão do patriarca da família. Do seu lado a velhota suspirava e ansiava pelo seu regresso. E que desta vez trouxesse alguma surpresa ou boas novas da vila. Por vezes ficava a saber que um amigo de infância tinha falecido ou que o filho do Zé do talho estava emigrado para França ou que o filho do carteiro Manuel tinha casado com uma moça da cidade e se tinha ido embora. A malta jovem queria ir embora, recusavam pegar na enxada. Que futuro dava uma leira de batatas ou uma fileira de macieiras? Estava na moda ir para o estrangeiro ou fugir para as cidades. Dava dinheiro trabalhar num escritório pequeno sem ver a luz do dia, preencher papéis, estudar até não poder mais. Ou então ir para a hotelaria. Muitos diziam fazer lá bom dinheiro. Mas o pequeno rapaz todos os dias esperava junto ao caminho com o seu sacho na mão. “Ainda não é hoje que o avô chega”, pensava ele quando o Sol desaparecia no horizonte. Até que chegava o dia. Ao longe, normalmente pelo final da tarde, surgia uma silhueta ao fundo da estrada. Estrada de terra, trânsito inexistente. Lá vinha o homem com um pau às costas, uma cesta na ponta do pau e um par de botas ao pescoço, novas, na mão trazia um cacho de bananas. Ao entrar em casa piscava o olho ao pequeno, escondia as bananas e dava um beijo na esposa. Mas a resposta não se fazia esperar, “Pronto, vendeste o burro e agora quem vai lavrar a terra? E para que precisas das botas? Ainda o ano passado compraste umas novas! Meu Deus, que vai ser de nós agora sem o animal. Conseguiste ao menos comprar sementes?”. Era então que puxava das bananas. Ali na vizinhança não havia bananas, e ele gostava, e a esposa ainda gostava mais. A discussão acabava logo, na semana seguinte já tinham novo burro, comprado por metade do preço a um amigo ali de perto.

A vida continuava. E, inevitavelmente, o final do Verão era anunciado pela viagem do burro a caminho da vila. Na chegada, durante anos assim foi, lá vinha o velhote com um pau às costas, um par de botas novas ao pescoço e um cacho de bananas na mão.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Desabafos de um benfiquista

Por norma, evito falar de futebol. Não que não veja ou que não goste de opinar, simplesmente sou uma pessoa ideias muito próprias. Se Mourinho é "o Único", eu sou "o Tiago Marquês Francisco". Tenho esse direito (e meia dúzia de documentos que corroboram a minha afirmação!). Agora, que fechou a Feira da Ladra dos Futebolistas, decidi opinar neste espaço. E hoje vou debruçar-me sobre o Benfica.

Mas antes, uma salva de palmas. O re-aparecimento das equipas B veio trazer magia ao futebol português. Alimenta a competitividade da Segunda Liga e serve de rampa de lançamento (e de afirmação) para o futuro da selecção nacional. Só espero não ver o tempo de Norton de Matos desperdiçado com a falta de ambição de certos indivíduos.

Quanto a saídas e entradas: para que raio existe a UEFA? Em certos países só se pode contratar até dia 1 e os milionários russos e franceses têm dias extra? Porque razão? Porque raio começam as competições com o mercado aberto? Como é que Javi e Witsel saem com o mercado praticamente fechado?

Ola John, o senhor 9 milhões, não sabe o que fazer com a bola. Não sei se desaprendeu a arte do futebol durante as férias ou se foi substituído por um cyborg mas não consegue acertar um passe nem tão pouco uma finta. Pré-época finda e nem três euros o rapaz valia. Salvio, bom jogador. No jogo com o Nacional, que de futebol pouco teve, foi uma lufada de ar fresco. Tem raça, velocidade, técnica, cruza bem, aparece ao segundo poste a finalizar. Foi caro, mas vai dar muitas alegrias ao Glorioso. Lima, ainda não se mostrou, mas é um excelente jogador. Desde Julho que digo, o ataque encarnado devia ser: Lima, Rodrigo, Nélson Oliveira e Kardec (é preciso alguém para servir de aguadeiro). Cardozo vendido por 10 milhões era lucro. Pode marcar golos, e marca, pode saber bater penáltis, e sabe, mas é zero em futebol. Raramente cria uma jogada, mal sabe dominar uma bola, protege mal a bola, não corre e desiste dos lances facilmente. Não me cativa, prefiro futebol a matraquilhos. Onde anda o lateral-esquerdo contratado ao Paços? E não falo do Melgarejo, que como avançado marcou mais golos que o Rodrigo mas nã tem cultura defensiva.

Saídas: adeus Emerson e Capdevila, duas novelas criadas por JJ; adeus Saviola, obrigado pelo título em 2010 mas claramente em quebra de forma e sem espaço nas opções do JJ; adeus Djaló, nem vale a pena comentar; adeus àqueles que não chegaram a entrar, adeus Javi e Witsel. O Benfica perdeu, no final do mercado, os dois pulmões, assusta-me, mas compreendo. Javi foi para o campeão inglês, Witsel para o campeão russo, dinheiro, títulos, Champions. O Benfica não consegue oferecer mais que isso. Não falem em amor ao clube, nenhum deles nasceu benfiquista. São dois jogadores que, enquanto vestiram o símbolo da águia, dignificaram o clube, deram sempre o máximo, jogaram bom futebol, nunca viraram a cara à luta e sempre honraram o Benfica. Dois excelentes profissionais que merecem mais. Boa sorte para ambos, obrigado por terem feito parte da história do meu clube. Substitutos? Ninguém é igual ao Javi ou ao Witsel. Temos Matic, que é lento mas tem uma enorme técnica, visão de jogo e poder de antecipação; Carlos Martins, que nunca devia ter saído, um enorme criativo; André Gomes, um puto que joga de cabeça levantada, corre, inventa linhas de passe, corre, remata, corre, corta ataques adversários, e corre; André Almeida, inventado a defesa direito por José Mota e médio da selecção sub-21, está em grande forma na B e fez uma grande época no Leiria; Miguel Rosa, uma promessa adiada pelo clube, criativo, lutador, enorme qualidade de passe, grande raça, atitude, um médio ofensivo goleador e inteligente.

Contudo, lamento mas... são quatro portugueses. Não me lixem, o Benfica apresenta três jogadores portugueses nas convocatórias. Portugal que, na última década, é das selecções mais fortes do Mundo. E nós damo-nos ao luxo de emprestar o melhor 9 português ao Deportivo e ficamos com o Kardec e o Cardozo no plantel, e ainda no ano anterior tinham dispensado três vice-campeões do Mundo. Isto é gozar com o patriotismo. Peço desculpa mas, antes de benfiquista, sou português. Para que raio serve o Seixal se não se aproveita ninguém? A alma benfiquista que falta no plantel existe, mas é escurraçada com um pontapé no cagueiro!

Posto isto, e lembrando a saída de Hulk, o Benfica precisa de muito para sair feliz desta temporada. Muitos extremos, poucos médios, nenhum lateral-esquerdo. Com o Nacional jogaram zero, valha-nos a raça do Maxi, a magia de Salvio e as fragilidades do adversário. O Benfica tem bons jogadores mas não consegue apresentar um onze que possa ir a Barcelona dar luta. Talvez me surpreendam, talvez o trio ofensivo (Cardozo, Lima e Rodrigo valeram 50 golos na Liga passada) resolva, talvez o JJ invente outra adaptação com o sucesso do Coentrão. Temos ataque para golear em metade do campeonato mas a falta de meio campo e as lacunas defensivas fazem-me ter medo da outra metade. Talvez consigam aguentar até Janeiro e aí contratam o tal lateral e com ele outro Javi ou Witsel. Talvez...


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Mentir ou distorcer a verdade é completamente diferente

Eu, por norma, tento ser responsável mas, em situações diversas e para um bem comum, sou daqueles que pensa em formas de fugir a ditas responsabilidades ou tarefas. Ou, simplificando, crio histórias e situações para escapar. O facto de eu não utilizar o termo "mentira" é ponderado pois raramente minto.

Vamos lá entrar no mundo de histórias e situações. Um sujeito, que, para evitar que me revejam nas situações aqui expostas, vou chamar Tó, está atrasado para o emprego. Uma chatice, é a terceira vez esta semana, o chefe fica chateado e coloca-o debaixo de olho. O Tó vai de carro e apanha a 2ª Circular, trânsito fluído e, de repente, trânsito cortado e lento com apenas uma faixa a circular. Houve um acidente entre dois veículos ligeiros. Chegado ao local da labora, o Tó dirige-se ao chefe e expõe a situação na sua versão: - Chefe, nem imagina. Vinha na 2ª Circular, trânsito lentíssimo, carros parados por todo o lado. Um acidente, mas uma coisa enorme. Contou-me um sujeito que, vinha um indíviduo lançado numa 600 e perdeu o controlo da mota e enfaixou-se num carro que por sua vez foi embater com um pesado de mercadorias. Um estrondo enorme, a estrada cheia de feijão enlatado e parafusos. Apenas uma faixa aberta para tanta gente. Pensei que ia lá ficar o dia todo. Entretanto, parei o carro e fui lá ver se precisam de ajuda. Havia mulheres a chorar e senhores a pensar nos estragos e nos seguros e nas chatices mas ainda consegui amenizar a situação e fiquei com o número de uma das senhoras, bem jeitosa, para o caso de conhecer um mecânico que possa ajudar a reparar o pára-choques. - Tudo tranquilo, o chefe acredita e o rapaz é aumentado por ser um cidadão à maneira.

Outra situação, o Tó, casado e a viver com a esposa, vai ao supermercado para comprar carne picada para o jantar. Chegado ao supermercado, não existe carne de porco picada em embalagem, a esposa não gosta de carne de vaca e a fila para o talho tem três velhotas. Para evitar demoras, até porque a esposa iria assumir de antemão que o Tó tinha encontrado uma mulher gostosa e espadaúda e tinha ficado no engate, o Tó pega numa caixa de entrecosto e vai para casa. Chegado ao lar, o Tó mete um ar descontraído, esconde o talão e diz, efusivamente: - Querida, nem imaginas. Lembrei-me que adoras entrecosto e estava uma promoção óptima que não pude resistir. Aqui temos umas tiras de entrecosto para meter no forno. (sentindo a pulsação da esposa a aumentar e os olhos a fugir para o preparado de molho de tomate e para o esparguete à espera da carne picada) Mas vai lá ver a telenovela que eu preparo o jantar. No final, se me deres um beijo, até lavo a loiça. Sabes como eu adoro cozinhar para ti. - Novamente, o Tó safa-se, a mulher fica toda contente, nem deixa que ele lave a loiça e arrasta-o para cima da mesa da cozinha para hora e meia de sexo louco e violento.

Numa última situação, vamos imaginar que o Tó termina mais um dia de trabalho, vai jogar à bola com os colegas e, após o banho, decidem-se por ir beber umas cervejinhas para um bar em frente ao campo onde a empregada é bem gira e costuma usar decotes apetitosos. O tempo passa, os copos vazios acumulam-se, os piropos para a simpática, e jeitosa, empregada acabam e o bar fecha. Cambaleando, o Tó e os amigos dispersam a caminho de casa. O Tó entra em casa, completamente embriagado, com o saco de desporto a tiracolo, a camisa mal abotoada, a braguilha aberta e um hálito capaz de embriagar um pequeno gato. À sua espera, a esposa e um rolo da massa. Calmamente, o Tó volta a usar o seu poder de argumentação: - Amorzinho, eu sei que não avisei que não vinha jantar mas eu embrulho e levo amanhã para o almoço, aposto que está maravilhoso como sempre. Sabes como são os rapazes, depois de uma futebolada vamos sempre beber uma água ao café do Xico. Mas hoje estava lá uma senhora, com cerca de 80 anos, que estava muito mal, a beber desalmadamente e a ingerir comprimidos com a bebida. Eu e os rapazes, receosos que a senhora se estivesse a tentar suicidar, ficamos a fazer-lhe companhia, a falar com ela, a explorar algo que lhe desse vontade de combater esse sentimento maléfico do suicídio. O problema é que, para conversar com ela, tínhamos de beber o que ela bebia. Ficamos todos podres de bêbados mas salvamos uma vida humana! - e, desta vez, não resultou muito bem. Na verdade o Tó é um primo meu que teve uns problemas ultimamente, a mulher pediu o divórcio, partiu-lhe dois dentes com um rolo da massa e ele agora está num manicómio a espumar da boca e a resolver puzzles para crianças de três anos. Tirando isso, não vejo porque alterar ligeiramente a verdade pode ser mentir...